Decidi falar sobre o princípio do meu lado artista, arteiro, enfim...
Após tocar alguns anos com a banda Suave Coisa Nenhuma e após o término da banda, decidimos eu e minha amiguirmã realizar um projeto só com mulheres tocando.
E assim fizemos e o nome era Sansaras, nome inspirado no livro de Hermann Hesse (Sidarta).
Eu no violão, 3 nos vocais e uma percussionista incrívelmente incrível.
às vezes me perguntam porque não pego um bar pra tocar e tals...penso que por trauma mesmo. A estrada não é fácil e tem coisas que machucam a gente bem profundamente...
Conseguimos esse bar pra tocar, centro de São Bernardo, pico bacana e tal. Tiramos os sons com maior carinho: Chico Buarque, Caetano, Raul, Marisa Monte, Secos e Molhados, Mutantes, Elis Regina, tudo que foi possível tirar e que achávamos que era de muito bom gosto e tal, coisas que gostávamos de tocar e cantar...
Muito legal 4 mulheres tocando e cantando, abertura de vozes, repertório diversificado e cá entre nós ...muito fino!
Até que após algumas apresentações o dono do bar chegou e disse na lata: ou vocês tocam músicas mais animadas, ou vou chamar o cara que está do outro lado da rua (que era o cara que nos indicou, inclusive). Ele queria música de rádio, música atual. E nós até tocávamos músicas animadas, mas do nosso gosto. É muito difícil encontrar essa medida da demanda e do desejo...
Um dia ele nos disse simplesmente assim: se algum dia eu quiser que um cara chegue aqui e compre uma garrafa de wisky e sente no balcão e comece a chorar eu contrato vocês novamente!
Isso foi forte...doeu, eu me senti muito mal, como se arte e música boa fosse só o que tocasse no rádio. E tínhamos até público, os amigos fiéis sempre estavam juntos onde quer que uma de nós tocássemos. E sempre foi assim. Até esse dia, que inclusive o dono do bar estava distribuindo doses de pinga pra todo mundo e uma pessoa disse: é grátis? quero uma também! O dono disse: é grátis pra quem está consumindo! Você não consumiu nada até agora! O cara comprou uma breja e dispensou a pinga grátis...Não sei se eu teria sangue frio pra dispensar a pinga grátis, enfim, assim foi...
O corre era feito por nós, que contávamos com amigos pra levar e buscar a aparelhagem e muitas vezes o cachê ficava quase todo nessa questão da logística.
Padecemos um bocado, mas aprendemos (ou pegamos trauma) de tocar em bares. E se vc vier me perguntar porque não toco em bares, é simples.
Trabalho com arte e não é fácil pra ninguém, sobretudo no país do tchetchereretchete...e perereca suicída, que não condeno, por entender das diferenças não só sociais, mas de gosto simplesmente e sobretudo cultural.
Hoje trabalho com música autoral mesclada com literatura brasileira e latino americana, porque eu sou apenas uma mulher latino americana sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vinda de muitas partes desse Brasil, porque meu pai trabalhou em boa parte do país e fomos sempre com ele.
Nada pra esconder ou me envergonhar, só uma imensa vontade de lutar pela música brasileira e promover isso até os meus ossos, onde for possível e preciso...
E sobre tocar em bares...Tenho outras poucas e boas que irei escrevendo aqui aos poucos.
Respeito muito quem toca e consegue suportar tudo que é preciso e possível de se passar, mas minha onda é outra...E to indo em busca dessa onda maior, com luta, sempre!
Beijo à todos e hoje recomendo Vida de Artista do grandessíssimo Itamar Assumpção.
Escuto quase todo dia, porque quando alguém me pergunta como faço tantas coisas, como tocar, fazer artesanato, cantar, escrever, ser formada em Psicologia, fazer pós graduação, ser mãe, esposa, etc. etc. etc. É essa música que me vem à cabeça. Muitas vezes é preciso viver o que está rolando no momento pra aprender alguma coisa ali, naquele momento. Sou assim...vivo intensamente os momentos.
Mais beijos então...em breve outras pérolas do caminho publicarei aqui...